terça-feira, 5 de abril de 2011

A teoria dos Bráulios




Pertenço a um grupo de pessoas seletas, se bem que hoje já tenho caído fora, pois a alienação daquela gente para o sexo passou dos limites da compreensão humana. Ainda me lembro bem das nossas reuniões realizadas à noite de sábados. Os Bráulios, era assim que nos chamávamos. Cada um possuía um número herdado não no ato de entrada, mas de acordo com uma interpretação numerologia criada pela nossa irmandade. Começávamos sempre exaltando a beleza de nossa pátria:
- No Brasil, existe uma incrível variedade de mulheres, dizia o número Sete, encarregado dos discursos de abertura. – Começando com as mulatas que se destacaram como rosto de beleza da nação brasileira. Há ainda outras de origem italiana, alemã, holandesa se pensarmos na época que o Brasil, ideologicamente, resolvera se clarear. O que deixou a trilogia étnica um pouco mais tênue. O que não vem ao caso aqui. A verdade é que me cansei desses discursos, o irmão Sete, às vezes me parecia um cachorro lambão. Quando entrei para nossa confraria; apenas estava interessado em foder a irmã número Seis, a mesma que me fez o convite num bar de esquina. Meu amigo me avisou da loucura daquela mulher, mas Luana era gostosa mesmo... Depois, passei a chamá-la de Seis, como todo batizado! O nosso batismo era orgia mesmo; não descreverei isso aqui, a finalidade deste texto é documentar para as gerações posteriores a existência da confraria dos Bráulios, nome que todos conhecem, mas poucos realmente compreenderam a beleza disso. Portanto, manterei uma postura rígida, exigida por um texto teórico.
A teoria dos Bráulios surgiu dessa variedade de escolhas; é claro que contamos também com o clima tropical, algo que tempera o estado de ânimo e transforma a vida em algo mais alegre. Pensei em usar o termo colorido no lugar de alegre, mas algumas palavras nos parecem inadequadas demais por gerar outros semas que possibilitariam uma interpretação errônea. Bráulio é Bráulio e pronto. A Seis quando me convencia naquele boteco de pertencer à irmandade, falara em meus ouvidos que enxerga duendes. Imaginei logo de início que os tais duendes era uma metáfora para o órgão genital masculino. Estava certo. O pior dos Bráulios era o fato de que até as mulheres queriam ser espadas, o que me fez cair fora rapidamente. Muitos irmãos e irmãs haviam protestado, uma vez que eu era o número Oito. Não liguei para nada. Sai. Por outro lado, carreguei comigo o mais fino dessa confraria, da qual agora, denomino A Teoria dos Bráulios:
Não há beleza no mundo sem as mulheres e isso qualquer homem concorda; digo homem, não me interessa as discussões homossexuais do tempo presente. A verdade é que sentado em uma mesa de bar num final de sexta-feira com meu amigo Patrick; pude observar o quanto da vida é efêmero e o que leva tantos homens a busca de mulheres perfeitas. Nesse caso, as prostitutas. Sei que muitos irão discordar ao ouvir isso, mas não se trata de nenhuma verdade. Isso é crença teórica e no melhor que você pode fazer é ouvir e pelo menos entender do que se trata. O público feminino no mínimo dirá que as putas nem se quer preenchem o requisito de ser mulher de verdade, mentira, mulher por mulher cafetão por cafetão, encontramos de montes. É provável que você, como leitor, esteja achando tudo isso teórico demais, por outro lado, o nome já diz ; trata-se dos Bráulios.
As mulheres que me perdoem, mas este texto não possui assim um caráter feminino nem tão pouco discorre de assuntos pertencentes a esse universo, quando pensamos na delicadeza e sensibilidade que só as mulheres possuem. A verdade é que mesmo na confraria, havia muitas mulheres nos seguindo; motivo esse que fazia muitos homens aderir a nossa causa, ainda que até hoje não sei direito qual é a causa, além de foder, é claro. Lembro-me claramente que o número Vinte e Quatro dizia que seriamos mais poderosos que os Iluminates. – Cale a boca! Os Iluminates nunca existiram! Isso é teoria de retardado. O que existe é o Bráulio!  Não há nada aqui que não seja de conhecimento popular, mas ainda assim não deixa de ser teoria. Bráulio significa espada em fogo, de acordo com sua raiz germânica. O que no nosso caso não importa muito, uma vez que nossas reuniões eram sempre em lugares abertos. Estávamos sentados numa mesa de bar, vendo a variedade de mulheres que desfilavam na Estrada do Pedroso quando o Vinte Quatro disse aquela asneira da qual o repreendi. A origem da palavra é apenas um dos significados, existem ainda os da prestatividade ou o da numerologia que indica o número seis. Não sei. Para muitos, braular significa foder. Para outros, Bráulio nada mais é que o órgão sexual masculino denominado de pênis, mas no popular encontramos pinto, pau, rola, cacete, tora, vara, caralho e tantos outros nomes que não me é possível listar neste estudo científico. Eu prefiro dizer caralho, porque rima com malho, é mais bonito e se lembrarmos os marombeiros das academias, então temos um sentido estético também.
Outra confusão que levou os Bráulios a se dividirem em direitas e esquerdistas foi à definição da palavra foder. A palavra foder pode ter origem na latina “fodio” que significa cavar, escavar, furar, transpassar, vazar, no caso os olhos e isso é muito significativo, pois um homem sente vontade de foder uma mulher quanto ele a vê. O que foi mais ou menos o ocorrido naquela noite de quinta-feira quando conheci a Seis. Também existe o sentido figurado de tirar, aguilhoar, torturar e isso tudo lembra o sadismo, espicaçar e dilacerar e por ai vai. Lembre-se que o termo libertinagem também está próximo da palavra liberdade, dizia o número Dois, encarregado de ensinar a doutrina aos recém batizados. O que em prática não representa a realidade, um desses vocábulos é aceito na sociedade, o outro é corrompido pelo purismo do preconceito. E isso também faz da minha tentativa de teorizar algo tão importante em um fracasso.
É melhor eu exemplificar com uma história real. Ainda que a realidade só possa ser captada por um momento, sem nenhuma reprodução. Quando fui à praça, no centro da cidade; encontrei o Gusta que queria beber um pouco e se distrair dos aborrecimentos da vida. Naquele dia, resolvemos andar e acabamos num bar próximo a estação ferroviária de Santo André. Havia uma ruiva dessas de cabelo tingido lá no fundo do bar. Eu e o Gusta vimos logo de cara. Mudamos de mesa; pensava em fechar a garota ali mesmo, mas ela foi embora. No final da noite, passamos no bordel ao lado, praticamente fazendo parede ao fundo do bar. Ela estava lá em todo seu esplendor de puta, tentando praticar o poli dance. A garota se chamava Marcela e tinha apenas dezenove anos. O Gusta estava sem dinheiro; eu busquei das minhas economias e fui. A mulher era casada e tinha um filho; me disse que saia com o rapaz daquela lanchonete onde estávamos, perguntei quem era.  - O moreno de cabelo em pé. Guardei o telefone dela. Ainda em outra tarde comentava com o Patrick esse desejo animal de sair braulando tudo. Ele me falava de Miss Julie, do Rubem Fonseca. Há muitos outros exemplos, existem aqueles que nos chegam por uma voz, como acontecera comigo, quando ainda lecionava em um colégio particular da cidade de Mauá. O Charles na sala dos professores havia me dito que um moleque de no máximo vinte anos saiu para beber e no auge de sua alegria, teve a sorte de ficar com uma garota muito boa, como não queria passar por ridículo e brochar. O que é bem natural na teoria dos Bráulios, diga se de passagem. O moleque tomou um viagra inteiro e acabou fodendo a garota a noite inteira, porém não ejaculou. Passou um dia inteiro com o caralho duro; acabou tento que contar aos pais, foi ao médico, mas havia passado tempo demais, cangrenou e teve que amputar o pau. Esse nunca mais braulou ninguém. Não sei, é necessário haver informação e responsabilidade, dizia à enfermeira que contou a história para o Charles. Entre tantas vitrines que nos passam, seja loura, morena, mulata, não importa. Vou continuar braulando.

Leandro Ramires Rodrigues é formado em Letras pela FMU, especialista em Literatura pela PUC-SP, atualmente realiza cursos como aluno especial na USP, lugar onde pretende abrir o mestrado em teoria literária. “Diálogos de metaficção em O Sol Se Põe em São Paulo, de Bernardo Carvalho”. Leciona língua portuguesa, literatura e redação para o ensino médio desde 1998, passando por outras modalidades de ensino também. Atualmente, é o conselheiro de Literatura da cidade de Santo André – gestão 2010/2012. Não se considera poeta nem escritor, palavras complicadas de se definir, mas se aventura no mundo da escrita desde 1997, quando um abençoado professor de literatura na faculdade de letras resolveu dedicar se de graça, abrindo uma oficina de criação literária. Ficou doente e desde então não mais largou a poesia e a ficção.



Nenhum comentário:

Postar um comentário